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Mudança no FGTS vai comprometer crédito imobiliário

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15 de agosto 2019

A liberação do FGTS para saques trará alívio imediato e temporário aos trabalhadores, mas não chegará a impactar economicamente o País. Pelo contrário, a longo e médio prazo, a medida deve comprometer a capacidade de financiamento imobiliário. Esta questão, que já vinha sendo advertida pela Fenae (Federação Nacional das Associações do Pessoal da Caixa), agora parece consenso entre os economistas.

Boa parte dos especialistas acredita que a medida será um "voo de galinha".  Os saques podem trazer risco à geração de emprego e renda, além de afetar diretamente os investimentos no setor da habitação.

Segundo o economista José Paulo Kupfer, parte do dinheiro deverá ser usado pela população para quitar ou reduzir as dívidas, desta forma o impacto no PIB (Produto Interno Bruto) seria modesto e corre o risco de não assegurar a estabilidade do FGTS. "Ninguém discorda de que esse tipo de medida tem efeito apenas temporário, equivalendo, na falta de suportes estruturais, a alguma coisa semelhante a vender o almoço para pagar o jantar. A pequena evolução da atividade econômica em 2018 e no primeiro semestre de 2019 é suficiente para comprovar as limitações desse tipo de estímulo”, avaliou Kupfer, em reportagem no portal Poder 360.

Na mesma linha, o economista Osmar Alencar Júnior, professor do Departamento de Economia da Universidade Federal do Piauí, afirmou que liberar o FGTS não basta para fazer o PIB crescer. "A situação econômica do País é muito grave. Vários economistas estão apontando uma tendência de queda no PIB, podendo cair até 1%, ou seja, uma tremenda recessão. [...] Mas esses R$ 500 será que são suficientes para gerar emprego? Talvez esse dinheiro seja usado pela maior parte da população para quitar alguma dívida com o sistema financeiro. Mas não acredito que isso vá implicar geração de emprego e aumento de produtividade", avaliou Júnior, em entrevista para o Portal O Dia.

Segundo a pesquisa Perfil do Consumidor Inadimplente, da Boa Vista, o percentual de consumidores inadimplentes que estão com mais de 50% da renda comprometida com o pagamento de dívidas saltou de 56% para 73%, na comparação entre o primeiro semestre de 2018 com o primeiro semestre de 2019.

Já a rodada de agosto da pesquisa XP/ Ipespe mostra que 41% dos entrevistados pretendem usar o dinheiro liberado do FGTS para o pagamento de dívidas. Apenas 10% têm a intenção comprar algum bem ou serviço e outros 26% planejam investir ou aplicar o valor.

Para o presidente da Fenae, Jair Pedro Ferreira, as regras sobre a liberação dos saques são soluções paliativas e sem sustentabilidade para enfrentar a crise de falta de emprego e renda no Brasil.

“Retirar recursos de um fundo que fomenta o desenvolvimento, a criação de empregos e ajuda a diminuir o déficit habitacional é prejudicial ao País. Hoje temos praticamente 7,7 milhões de famílias sem residência e o FGTS é um grande fundo que ajuda na construção de residências mais baratas”, completou Ferreira.

Crédito para a habitação

A agência de classificação de riscos Fitch Ratings viu potenciais consequências negativas a longo prazo nas medidas adotadas pelo governo. Caso a economia não retorne ao crescimento sustentado, poderá ocorrer um impacto desfavorável no crédito imobiliário. Neste caso, a mais afetada pelos saques é a Caixa Econômica Federal, responsável pela administração do Fundo, o banco tem a maior carteira imobiliária do mercado, cerca de 69%.

Parte do saldo total das contas do FGTS é utilizada pelo governo para financiar linhas de crédito nas áreas de habitação, saneamento básico e infraestrutura. Do orçamento de R$ 85,5 bilhões aprovado para 2018 pelo Conselho Curador do FGTS, R$ 69,4 bilhões foram destinados para a área de habitação. 

A redução do Fundo poderá aumentar ainda mais o descasamento que já existe entre ativos e passivos ao elevar a participação da poupança na proporção do financiamento total. A poupança é uma das duas fontes principais de “funding” para o crédito imobiliário, responsável por 55% do financiamento das operações de crédito. O FGTS responde por 45%.

Em um cenário de médio prazo, a medida também não terá um impacto significativo para o crédito imobiliário. Na avaliação da Fitch, será um impacto neutro em um período de ao menos dois anos.

Essa conjuntura pode limitar a habilidade do fundo de promover funding para o crédito imobiliário. A avaliação contraria as informações passadas pelo secretário especial de Fazenda do Ministério da Economia, Waldery Rodrigues. Na semana do anúncio das medidas para o FGTS, Rodrigues afirmou que o funding para os financiamentos dos setores de construção civil, saneamento e infraestrutura não seriam afetados.

Fonte: Fenae, com informações do jornal Valor Econômico e dos portais Poder 360, O Dia e Reconta Aí